segunda-feira, 8 de outubro de 2012

A FESTA DO EXCESSO


 Aracaju teve 404 candidatos a vereador. Isso significa quase 17 pessoas vomitando mesquinharias na televisão para conseguir uma das 24 vagas. O número é o menor entre todos os estados do Nordeste – em Natal, terra do segundo menor, 426 pessoas disputaram traços de tempo na televisão e no rádio; em Salvador, 1166. Como o Nordeste nunca foi referência de nada relativo a avanço, os números de Aracaju continuam vergonhosos.

A concorrência ideal para os candidatos a vereador, aqui, não deveria passar de três. Ao invés de 404 pessoas dizendo asneiras em uma nesga de tempo, teríamos 72. Eles seriam um grupo seis vezes menor, mas com seis vezes mais tempo para convencer o eleitor minimamente atento de que são alfabetizados. Ou de que sabem escrever e fazer conta. Ou de que conhecem pelo menos o bairro que representam. Ou de que têm algumas ideias para o calçamento. Ou de que ficam bem de terno.

A população em massa não sabe pra que serve um vereador. Como os candidatos são parte da população, é muito provável que eles também não saibam. A única alternativa para dar prosseguimento a um processo obrigatório e alienígena a todos é a da troca franca de favores: eu não sei para que você serve, mas sei que vai ganhar muito. Dê cá um pouquinho se quiser entrar.

É uma troca justa. Primeiro, porque os tribunais eleitorais, os primeiros a chatear a população com palavras impronunciáveis e com inalcançável nível de abstração, como democracia e cidadania, não têm a menor ideia do que fazer para explicar a um cidadão o que é, de fato, uma eleição. A única coisa que o cidadão sabe é que ela é obrigatória. Coisas obrigatórias são aborrecidas. E tudo o que é aborrecido fica menos aborrecido quando se dá um jeito de ganhar um dinheirinho com ele. Os brasileiros são meio entediados.

Segundo, os tribunais eleitorais são os primeiros a impedir que os eleitores conheçam efetivamente algum candidato, tornando-os uma massa de desesperados se empurrando na televisão para proferir, em quatorze microssegundos, seu primeiro nome e um número da qual jamais lembraremos. Já que não dá tempo para estabelecer critérios de escolha, que o critério seja o do bolso. Quem oferecer mais leva. A eleição, assim, é o leilão mais rápido e espontâneo da sociedade. É o fastígio do nosso prezado livre comércio.

Lugares muito mais desenvolvidos do que Aracaju no âmbito da proporção vereador/candidato são Cumbe e Itabi. Na vanguarda do estado, os dois microscópicos currais eleitorais tiveram 33 candidatos a vereador pleiteando uma das 9 vagas – cerca de 3,6 candidatos por vaga, índice bem satisfatório. A campanha se deu predominantemente por meio de corpo a corpo em povoados. Quem tinha mais condições fazia algum panfleto. Toinho de Tonho Machante investiu na ausência de erres em sua campanha. Wlisses e Junior de Rapoza investiram na fonética.

Não estive em Cumbe nem em Itabi – e não pretendo estar tão cedo. Mas as maravilhas da matemática permitem inferir que a campanha para vereador foi muito mais interessante por lá do que em Aracaju. Em ambos os municípios, o eleitorado não tinha de escolher entre 404 coitados atrapalhando a programação televisiva. Eles só tinham de aguentar 33 sujeitos e, mesmo assim, ter o prazer de trancar o ferrolho da porta na cara de cada um deles. E tudo isso com um detalhe fundamental: com a perfeita noção do nome, do número e do nível de aborrecimento relativo a cada candidato.

Aracaju deve merecer os vereadores que escolheu. Mas com certeza não merece 404 candidatos. Enquanto os tribunais eleitorais não decidem o que fazer com a festa do excesso que é a eleição - excesso, inclusive, de ignorância - , deixemos analfabetos, iletrados e desesperados de toda a sorte ganharem um negocinho com ela em paz.

Um comentário:

  1. O programa eleitoral está passando por modificações e a sociedade em geral está se adaptando a ele,o que é lamentável.Suas funcionalidades estão regredindo,o que era pra ser uma apresentação de propostas,está servindo para "alegrar" a massa e apelar ao medíocre,A volta da política Pão e Circo.
    Adversários jogando baixo,apresentando o lixo um do outro,ao invés de serem diretos com suas propostas, eles fazem parecer que quem vencerá a eleição é o menos sujo,como aquela frase,"o sujo falando do mal lavado" ou se preferirem "macaco não olha pro rabo".
    É um número absurdo de candidatos,mas, poucos não,raros são os que estão ali por algo sério.
    Me sinto culpado,um pouco,pois admito que sinto graça dos palhaços,dos sósias,dos absurdos em geral,as vezes dou risadas não por graça,mas por pena daquele individuo,que se prepara durante toda um campanha,que passa por uma burocracia tremenda(assim espero),vai fala por 15 segundos,nada. não fala nada! só lixo e lixo,mas é legal,vai que numa dessas sai um futuro artista né? com suas faces pintadas,barbadas todas caracterizadas,talvez o programa eleitoral seja um novo método de se apresentar ao mercado de trabalho,para os circos talvez.
    A nova geração de candidatos,onde ela irá buscar referencias?Propostas,ideias?Ou será que ela vai seguir com a palhaçada que é o mais simples,alias quase todos da sociedade aceita,pra que mudar?
    Espero que meus companheiros de geração não pensem assim.

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